Reportagem

Orçamento do Estado. Jogada política ou falta de poder da esquerda?

Apesar das tentativas de negociação dos partidos mais à esquerda, o Orçamento do Estado continua sem aprovação à vista. A proposta de lei do OE para 2022 deve ser apresentada à Assembleia da República até quarta-feira. Na Universidade do Minho, as opiniões divergem, mas uma eventual crise política preocupa os estudantes do Ensino Superior.

Numa mesa distante e escondida, Diogo Oliveira, reticente, aceita o convite para falar sobre a situação política que o país enfrenta. Após pousar o livro que tem na mão, o jovem estudante de mestrado em Negócios Internacionais admite não estar a par das conversações sobre o OE, mas prova-nos o contrário. Para o aluno, tudo depende do Bloco de Esquerda “para o Orçamento ser aprovado”. Todavia, acrescenta que, caso o partido ceda, vai contra “tudo aquilo que tem defendido até agora”.

Apesar de o Governo manter as negociações em aberto, a líder do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, indicou que as nove propostas apresentadas, no âmbito da saúde e do trabalho, foram recusadas “uma a uma”. Contudo, e com intenção de votar contra no dia 27 de outubro, o partido encontra-se disponível para negociar “até ao último momento”.

Maria João, aluna de Direito, justifica o voto contra do BE, pois o Orçamento do Estado é “muito à direita e muito conservador”. Para Miguel Oliveira, casualmente à conversa com a colega a caminho da aula, há uma “intransigência de alguns partidos políticos, nomeadamente BE e PCP, que se comprometeram a ajudar o governo”. Num clima de mais seriedade, ambos concordam que há riscos de o governo cair.

Com os votos contra do BE e PCP, e a abstenção do PAN, o cenário mais provável é o de uma “crisezinha”, ironiza Maria João. Miguel ri. Mesmo que, na opinião da estudante, o PAN seja o primeiro a ceder, a situação vai-se manter instável. No limite, Marcelo Rebelo de Sousa vai anunciar a dissolução da Assembleia da República e ponderar convocar eleições antecipadas, caso o Orçamento seja novamente chumbado. A decisão é tomada pelos estudantes como compreensível, mas todos percebem que não serão imediatas.

Ainda que não seja um cenário inédito em Portugal, também não é frequente. Em 1979, durante o IV Governo Constitucional conduzido por Carlos Mota Pinto, o governo caiu. Mais recentemente, em 2004, Jorge Sampaio responsabilizou a dissolução do Parlamento com a falta de credibilidade do Governo de Santana Lopes. No entanto, nunca se chumbou um OE em Portugal.

Maria João, já perto do destino final, percebe que o partido em breve vai perder votos. Por isso, acredita que Catarina Martins possa estar a aproveitar esta conjuntura para fazer uma “jogada política”. A discussão torna-se acesa quando Miguel afirma que este deveria ser um momento em que “o bem do estado e a paz social” deveriam estar acima “de toda e qualquer ideologia”. A simpatizante do Bloco, algo indignada, contrapõe e aponta que BE e PCP já “cederam demasiadas vezes” e devem manter “a natureza ideológica e a alma dos partidos”.

Num quadro cada vez mais negro, os três jovens refletem sobre a perda de influência da esquerda e sabem que o panorama atual do OE não é o mais favorável para o país. Ainda assim, aguardam com esperança um desfecho positivo para os portugueses.

Cláudia Araújo e Sofia Carneiro

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